terça-feira, 21 de abril de 2015

Imagens que revelam

Quando Mateus nasceu foi aquele alvoroço em minha vida. Misto de sentimentos e encantamento por cada descoberta. A quantidade de fotos que tiramos dele, mesmo cuidando para não perder momentos de olho no olho e a vivência plena da experiência, foi enorme e revela o quanto o consumo é realmente uma marca forte de nossa contemporaneidade e temos de cuidar para que nossas relações não fiquem afetadas por ele.

Certa vez, Mateus tinha uns dois meses, uma tia foi conhecê-lo em minha casa. Conversamos bastante até que finalmente ele acordou, o que gerou em todas nós uma grande alegria. Após mamar Mateus ficou num bercinho à nossa vista quando então minha mãe pediu que eu compartilhasse as fotos e vídeos que andei produzindo com o pequeno. Nesse momento, percebi a incoerência em deixar de aproveitar a presença do pequeno acordado para buscar por suas imagens virtuais, e assim todos nós conseguimos não perder a chance de curtir a companhia deliciosa dele bebê.

Já quando minhas meninas nasceram vivemos uma situação oposta, pois conseguimos tirar poucas fotos das duas, o que, confesso, ao invés de me tranquilizar, me fez me sentir bastante culpada. Na véspera delas completarem um ano cheguei, inclusive, a encomendar uma sessão de fotos com minha amiga Renata como mencionei na postagem "Pausa para uma pose" como maneira de registrar aquele momento familiar importante.

Com o tempo, me aceitei cada vez mais como a 'melhor mãe possível para os meus filhos' e estudando sobre documentação pedagógica para meu trabalho na escola, consegui lidar de um jeito mais tranquilo e focado em relação às documentações de meus pequenos. Assim, tive certeza de que quantidade não é qualidade, que fotos posadas são bacanas como registros, mas bem mais bacanas mesmo são as que revelam pensamentos, sentimentos, descobertas, brincadeiras e saberes dos sujeitos. Aquelas imagens que contam histórias e criam outras interpretações, que suscitam reações aos que as veem, e que por estarem dentro de um contexto, podem ser planejadas - o que não significa ausência de surpresas no meio do caminho, mas presença de intenções desde a princípio, inclusive, a respeito de como compartilhá-las.

Ter um blog que expõe a mim e a minha família fez com que aumentasse a minha preocupação sobre todas essas questões. Para mim, a existência desse espaço de troca de reflexão se justifica pelas palavras de Bartolomeu Campos de Queirós:


“A beleza é aquilo que você não dá conta de ver sozinho. Ao ver algo bonito demais você logo quer dividir com o outro. A beleza é o que não cabe só em você, é aquela coisa que quando você sente, precisa dar pro outro. Você vê um pôr do sol bonito da janela, vê um quadro no museu, lê um livro e pensa: fulano precisava estar aqui, ou, eu tenho que ler isso pro meu filho. É extremamente triste estar sozinho quando se encontra a beleza.”
                                                          

Acredito que certamente por conta dessa concepção é que eu e Luiz andamos recebendo alguns elogios pelas imagens de nossos filhotes e pela maneira de compartilhá-las, sem exibi-los desnecessariamente e como nossos troféus. Nossos filhos são seres que merecem respeito aos seus processos únicos de aprendizagens, por isso mesmo interrompe-los a todo momento só para tirar uma foto posada não soa coerente. Isso sem falar de cuidarmos para não passarmos a mensagem aos nossos filhos de que absolutamente TUDO o que fazem merece um registro, e ainda por cima, compartilhado na rede. Quem me conhece bem sabe que nesse sentido tenho alma antiga, e por isso não acho que tudo que fazemos é importante para os outros - essa história de 'se sentindo...', 'partiu...'.

É verdade que em tempos atuais, em que nunca estivemos tão conectados ao mesmo tempo uns com os outros, o virtual pode tornar-se real, e vice-versa. Muitos são os exemplos (positivos e negativos) para essas situações. E estamos aprendendo a construir nossas relações nesse novo formato, em rede. É um momento que exige cuidado como, por exemplo, em relação à diferenciação de público e privado, e também é um momento potente, em que podemos nos beneficiar dessa rede ativa.

Como exemplo de aspectos positivos, entrei em contato com uma seleção de fotos intitulada: "32 fotos tiradas de crianças brincando ao redor do mundo" que achei sensacional: http://awebic.com/cultura/32-fotos-tiradas-na-hora-de-criancas-brincando-ao-redor-mundo-27-e-mais-divertida/ . Recomendo! São belas imagens de crianças totalmente mergulhadas em suas explorações e que nos abrem a porta da informação e da criação. Nesse sentido, outro exemplo de que esses novos tempos podem nos propiciar muita troca interessante foi a possibilidade de ver essas fotos junto a Mateus.

Achei interessante que durante essa vivência, em momento algum ele mostrou surpresa quanto às diferenças de cores, roupas das crianças das imagens. Seus comentários revelaram desejo de brincar da mesma coisa e estar no mesmo lugar. Vi que um mundo se abriu para ele! Quando ele viu que tinham crianças da África, sua primeira surpresa: "Mas cadê os bichos?", e ao saber que também existem pessoas ele mal acreditou que neste lugar que já há tempos desejava conhecer por conta dos animais também tem crianças - que jogam futebol, outra de sua paixão! Outra surpresa, ver que em lugares distantes (informação dada por mim e não necessariamente entendida plenamente por ele) as crianças brincam das mesmas coisas que ele: jogar bola, pular corda, na água, no mato, com os bichos, fazendo pinturas no corpo. Uma beleza só poder viver com ele essa possibilidade de ver o mundo desse jeito: tão diverso e tão integrado! É o que todos nós, cada vez mais, precisamos aprender para vivermos numa democracia com ética e estética.

Nenhum comentário:

Postar um comentário