terça-feira, 29 de julho de 2014

Cecília: seja bem vinda!!!

Fiquei extremamente feliz com tantas notícias de nascimentos, só pode ser a anunciação de bons tempos... Mais um bebê, da turma das "barrigudas" da escola, nasceu, inclusive, no mesmo dia que Alicia...

Foi Cecília, pequena menina com nome de grande poetisa, filha de uma mãe pequena só de altura, pois grandiosa de coração, a minha querida Clelia.

"Quem falou de primavera sem ter visto seu sorriso, falou sem saber o que era." Cecilia Meireles

Clelia me ajudou muito quando Mateus entrou na escola e foi sua orientadora.

"Há pessoas que nos falam e nem as escutamos, há pessoas que nos ferem e nem cicatrizes deixam mas há pessoas que simplesmente aparecem em nossas vidas e nos marcam para sempre." Cecília Meireles

Clelia acolheu não só meu pequeno como também a mim e a Luiz, respondendo nossas dúvidas e principalmente ampliando nosso olhar sobre nosso filho. Sempre mostrando um olhar cuidadoso, respeitoso e investigativo para com ele. Aprendemos muito sobre nosso pequeno por meio de seus olhos e palavras e gostamos muito do que vimos, temos ainda mais orgulho de nosso moleque que vez ou outra faz "transgressões saudáveis" como ela costuma dizer...rs. Por tudo isso, ela terá sempre um lugar especial em nossa família.

"Liberdade, essa que o sonho humano alimenta, que não há ninguém que explique e ninguém que não entenda." Cecília Meireles

Agora, chegou a vez de Clelia transmitir esse amor que existe impregnado nela, também à sua pequena Cecília, menina de sorte que vai sempre viver inundada pelos melhores sentimentos.

"Tenho fases, como a Lua; fases de ser sozinha, fases de ser só sua. " Cecília Meireles

Essa pequena chegou ao mundo com muita saúde e por hora Clelia segue se recuperando bem da cirurgia que exigiu alguns cuidados a mais e imagino que muito desejosa para segurar a filhota.

"De longe te hei de amar - da tranquila distância em que o amor é saudade e o desejo, constância." Cecília Meireles

Estou na torcida!!! Nada é mais merecido do que isso: uma mãe ter suas filhas em seus braços, uma filha ganhar o colo da mãe.

"Basta-me um pequeno gesto,
feito de longe e de leve,
para que venhas comigo
e eu para sempre te leve..."
Cecília Meireles

Nada há de ser por acaso nessa vida, e certamente essa história será contada de Clelia à filha com toda a força e ternura que lhe são peculiares.

"Aprendi com a primavera; a deixar-me cortar e voltar sempre inteira." Cecília Meireles

"Quanto mais me despedaço, mais fico inteira e serena." Cecília Meireles

Um grande beijo no coração das duas, com carinho de todo mundo daqui, especialmente Mateus que ficou muito animado com essa notícia. Fiquem com Deus.

"Pus-me a cantar minha pena
Com uma palavra tão doce
De maneira tão serena
Que até Deus pensou
Que fosse felicidade e não pena" Cecília Meireles

Alicia: seja bem vinda!!!

Hoje foi dia de volta ao trabalho e assim dia de me dar conta de que mais uma pequena nasceu da turma de "barrigas" da escola, a Alicia, filha da querida Roberta e do Gilberto, o Giba como ela carinhosamente o chama, e irmã da Betina. Uma bênção!

A foto dela no facebook é uma fofura só, toda amassadinha, com um biquinho delicado e cabelo punk... vontade de apertar ainda mais! Desejo toda felicidade a essa família, que muita coisa boa continue a acontecer em suas vidas. Beijo grande, em especial para a pequena Alicia e para Betina que até a roupinha da irmã ajudou a lavar... Fofas! Certamente essas duas juntas ainda vão brincar muito de casinha, proporcionando cenas preciosas de beleza e emoção aos pais... Parabéns e aproveitem muito cada momento único.

João Pedro Pocci: seja bem vindo!!!

Com muito atraso, mas com MUITO amor... Segue meu "seja bem vindo" a João Pedro, filhote da Mariana e do Daniel.

Acompanhei a chegada desse pequeno desde o início... Quando era ainda um desejo vago com divagações de "como será que me bebê vai ser...", depois, um plano mais concreto com a busca por centenas de ginecologistas, a confirmação da gravidez com os enjoos, e mais enjoos e outros mais, o nascimento do amor materno com uma mãe sugada de força e energia, mas mais tranquila do que o habitual e com a barriga crescendo aos poucos, a mãe voltando a ficar corada, animada com a aproximação do pequeno que assim que foi nomeado, João Pedro (nome lindo!), já estava pronto para nascer, mostrar sua carinha, e fazer derreter a mamãe que agora o chama de fofo.

Mari querida, desejo toda a felicidade do mundo a você e ao seu pequeno. Continue contando comigo para o que precisar, minhas férias acabaram e agora já estou com a cabeça de volta no lugar (único motivo para tanta demora em prestar minha homenagem a você e a seu pequeno).  Quero continuar acompanhando suas novas aventuras como mamãe e as descobertas de seu filho e não apenas como alguém que pode relatar experiências para te inspirar, mas como alguém que também quer te ouvir e aprender contigo. Como você mesma cobrou, não te contei sobre amamentação, assim como não te contei sobre um monte de coisas, porque as experiências são assim mesmo, diversas, e todas igualmente importantes para nossas construções simbólicas do que estamos vivendo e sentindo, e certamente, o melhor jeito de descobri-las é vivendo-as ao lado de pessoas queridas, as experimentando ao nosso próprio modo e aproveitando muito.

Beijo grande. Não vejo a hora de conhecer o pequeno, te dar um abraço e me divertir com suas novas histórias de "ser mãe é padecer no paraíso"...rs



segunda-feira, 28 de julho de 2014

Pelo fim da guerra

Amo História, amo histórias. Por isso, as aulas de literatura e de história eram minhas preferidas na época de escola. Por um tempo cheguei até mesmo a cogitar fazer faculdade de história. Mudei de escolha mas quiçá um dia venha a cursar esse curso por hobby em tempos de aposentadoria...rs.

Já naquela época, apesar de amar conhecer e pensar sobre as escolhas dos diferentes agrupamentos humanos e seus desdobramentos e assim compreender melhor os nossos modos de viver tinham alguns eventos que realmente por mais que tentasse eu não entendia...

A Pedagogia, como era de se esperar, não me ofereceu uma maior compreensão de todos os fenômenos históricos do mundo, contudo, ela me presentou com algo extremamente importante que foi o resgate e a valorização de minha própria história além da consciência de que ela começou muito antes de eu nascer. Sou parte de uma história muito maior que meus ancestrais começaram a construir há muito tempo, em conjunto, o que garantiu a sobrevivência da espécie e a construção de coisas materiais e simbólicas magníficas. Por isso, como disse uma aluna, precisamos ser gratos a eles, por tudo o que fizeram pela nossa existência. Somos todos conectados por uma mesma origem, em busca de sonhos comuns e com a possibilidade de construção e reconstrução de novos rumos, novos tempos.

Um desses conflitos que nunca entendi é entre Israel e Palestina. Uma guerra que não está em mim, definitivamente. Matar em nome de Deus? Como disse Rubem Alves:

"Não tenho problemas com Deus. Mas tenho muitos problemas com aquilo que os homens pensam sobre Deus."
"Deus é alegria. Uma criança é alegria. Deus e uma criança têm isso em comum: ambos sabem que o universo é uma caixa de brinquedos. Deus vê o mundo com os olhos de uma criança. Está sempre à procura de companheiros para brincar."

O recente bombardeio mútuo entre os dois Estados tem matado milhares de pessoas e precisa parar. A matéria a seguir foi a que mais me encheu de esperança pelo que está sendo construído a respeito por muitos brasileiros como maneira de contribuir para mudanças necessárias de paradigmas em nossas sociedades. Que venham novos tempos de maior tolerância, respeito e paz!!!

http://outraspalavras.net/blog/2014/07/23/brasileiros-pedem-fim-da-violencia-contra-palestina/

quinta-feira, 24 de julho de 2014

Tarja branca - O Filme

"Tarja branca" é um documentário maravilhoso, tocante e essencial que frisa a importância das brincadeiras em nossa infância e também em nossa maturidade, por meio da cultura popular, como o verdadeiro remédio que cura nossas almas. Nele, muitos depoimentos são dados tanto no sentido de retomarem suas memórias  sobre o quanto a presença ou ausência das brincadeiras em suas trajetórias foi formador ou deformador como de refletirem sobre o cenário contemporâneo marcado pelo consumo, privação do espaço e do tempo, desconsideração do sujeito, de sua potência, liberdade e autoria e da necessidade dele compartilhar experiências com o outro, numa situação coletiva lúdica.

Em defesa da cultura da infância, educadoras como Maria Amelia Pereira questionam o papel da escola nesse processo que, em geral, se desresponsabilizam ao falarem de crianças hiper ativas sem perceberem que na verdade estão hipo ativas, sem estímulos, e outras como Lydia Hortélio ampliam nosso olhar sobre as brincadeiras sobre elas têm a ver com nossa ancestralidade e estão inscritas em nossos corpos e foram maneiras ativas, eficientes e positivas das sociedades serem construídas. Um leque de possibilidades lúdicas se abre então à nossa frente e podemos mais uma vez reparar como cada gesto e olhar de uma criança é recheado de intenções, maravilhamentos e saberes. Dos mais genuínos, verdadeiros, aqueles que quero e busco, e se não dermos o devido valor muita gente ainda vai continuar a depender como única opção, lamentavelmente, de remédios tarja preta.

Ser feliz não é obrigação, é nossa sina, nossa vocação.

Assim, o documentário é recheado de falas e imagens belíssimas que levam o expectador também a resgatar sua própria história além de repensar sobre sua vida atual. Em diversos momentos me emocionei com a criança plena que fui, a adulta que frequentemente busca se resgatar e ainda brincar nas festas populares, com alunos e meus filhos. Junto de companheiras como Lydia que diz: "Eu tô pela revolução que falta que é a revolução das crianças".


Para quem não assistiu, fica a dica:

 
 
E olhem meu orgulho ao saber que meu marido, professor de educação física, irá promover uma conversa após uma sessão para educadores deste filme.... Orgulho sem fim!!! Parabéns, meu amor.
 


segunda-feira, 21 de julho de 2014

7 anos de casório

Hoje eu e Luiz completamos 7 anos de casados... viva!!! No sábado conseguimos dar uma saída para comemorarmos todos esses anos vividos ao lado um do outro.

Neste ano quero registrar meu agradecimento especial por ele ter ficado com nosso "trio parada dura", mais sua mãe e irmã que também ajudaram, para que eu viajasse a um curso de 5 dias. Foi um gesto generoso, e sei o quanto foi corrido para ele, ainda que esteja bastante acostumado com essa situação.

Muitas pessoas me perguntaram se eu ficava tranquila em deixar as crianças com ele, o mesmo que aconteceu com minha amiga Miruna - tem até o relato dela aqui no blog, demonstrando mais uma vez que infelizmente ainda muitos pais não assumem esse papel com responsabilidade e alegria. Diferentemente do Lu que vez ou outra, por exemplo, diante de algum choro das crianças pedindo pela minha presença para dar banho ou outra coisa, ele fala a cada uma: "Eu também cuido de você, eu também gosto de você então eu vou te dar banho", e assim o faz, e quando vejo, logo em seguida todos estão às gargalhadas, envolvidos numa cena de amor.

Como já disse em outra postagem, acho mesmo que para ser um bom pai precisa ser muito macho. E macheza no melhor sentido (sim, como tudo na vida as palavras também podem carregar seus melhores ou piores sentidos). No caso, é aquela de quem se responsabiliza por suas tarefas, assume seu papel, faz os cortes paternos necessários como, por exemplo, quando ele provoca Mateus dizendo que sou esposa dele, e principalmente NÃO ter preconceitos ao demonstrar e construir afetos como, por exemplo, se mostrar sensível diante de um bebê e de uma mulher recém parida, frágil e cansado diante das dificuldades e amoroso em cada gesto nas novas relações que passam a ser vividas após o nascimento do filho ou filha, até mesmo com a pessoa, já que ninguém passa imune a essa experiência. Tem gente que acha que bebê junta casal, eu acho o contrário. Precisa mesmo muito amor e disponibilidade para dedicar-se aos novos laços afetivos, com suas delícias e desafios.

Eu tive esse pai presente e amoroso e não poderia escolher um pai diferente para meus filhos. Luiz é esse pai. Presente, inteiro, carinhoso, responsável, o que ajuda muito nossa relação de casal na medida que me dá espaço para eu ser mãe e também esposa, profissional, estudante, amiga, mulher. Nessa viagem, por exemplo, foi com enorme alegria que num dia de desencontro com as amigas que andei pelas ruas da cidade sozinha, sem rumo, à deriva. Vi cenas lindas como universitários se formando em festa com suas famílias, retomei minha vida, as escolhas que fiz, e colocando na balança as perdas e ganhos inevitáveis de todos processos, se é que as coisas podem ser entendidas dessa maneira, me senti mais uma vez absolutamente uma mulher de sorte, feliz. E Luiz é com certeza um dos responsáveis por tanta coisa boa ter acontecido em minha vida...

A começar por ele ter aparecido em minha vida, tamanha sorte, ou quando acreditou em mim, em nós, quando eu ainda era solteira convicta e não tinha percebido que já estava totalmente entregue a ele, ou quando acreditou que seria bom para a gente ter um filho e ainda, a cada vez em que continua a demonstrar com gestos, palavras, olhares o quanto vale à pena estar ao seu lado, junto de nossos filhotes, construindo nossa pequena grande vidinha de todo dia por meio de constantes discussões sobre nossas distintas, mas não contraditórias maneiras de ver o mundo.

Obrigada meu amor. Na época de nosso casamento li esse comentário de Rubem Alves (continuando minha homenagem a ele iniciada na postagem anterior):

"Nietzsche disse que só existe uma pergunta a ser feita quando se pretende casar: "continuarei a ter prazer em conversar com esta pessoa daqui a 30 anos?"

A resposta, é bem sabida... Te amo.



PS: Uma propaganda fofa que mostra um pai precisando assumir as rédeas da situação. Atenção, mulheres de plantão, precisamos abrir espaços para eles ainda que façam as coisas de um jeito diferente do nosso (e irritante por vezes)...rs. Porque é esse espaço, essa iniciativa e essas diferenças que fazem cenas lindas como essas...



 

Quando eu era menina... Homenagem a Rubem Alves

Quando eu era menina a roça era um lugar mágico em minha vida, onde as coisas, as pessoas se transformavam, renasciam, se encontravam.

Em minhas memórias, por exemplo, minha mãe sempre tão preocupada com limpeza e organização, na roça se transformava e ficava mais "cuca fresca". Lindo vê-la assim tão focada nas relações afetivas, nas experiências significativas e no respeito ao processo do outro. Já meu pai, assim que colocava sua calça e chapéu "velhos de guerra" se encontrava com suas raízes mineiras e era só sorriso de orelha a orelha. Lindo vê-lo assim tão mergulhado nessa interação com a terra, com cada cheiro, sabor de fruta, cada gesto de vida.

Nesse espaço, a pé, de bicicleta ou à cavalo eu, meus irmãos, meus primos e amigos ganhávamos o mundo. Saíamos cedinho, voltávamos intuitivamente para a hora do almoço e novamente estávamos ao ar livre. Mesmo à noite era comum brincarmos de pegar vaga-lumes, sapos e morcegos ou nos envolvermos num divertido polícia e ladrão. Infância livre, respeitada, potencializada, extraordinária.

Histórias e mais histórias guardo dessa época ainda que me lembre pouco de situações específicas. Lembro-me sim, e com intensidade, do sentimento e do clima vivido nessa época. Uma lembrança como se fosse uma fotografia em movimento. Vejo a mim e outras crianças interagindo, brincando, se afetando, se tocando numa fluidez de relações harmoniosas, independentes, saudosas. Carrego esse sentimento até hoje, porque realmente foi algo constituinte de mim. Está impregnado em minhas memórias, em minhas construções, preferências e escolhas.

Algumas memórias mais organizadas para serem compartilhadas são de como gostávamos de brincar no meio de um bambuzal à beira da estrada em Jambeiro. Lá, cortávamos bambus, organizávamos os cantos da casa e construíamos lugares para nos sentarmos, cozinharmos e assim fomos aprendendo a planejar as narrativas e muitas vezes a própria preparação do cenário já era nossa brincadeira preferida. Outras vezes ensaiávamos um teatro e que vez ou outra era apresentado aos pais e fomos aprendendo a dar importância para nossos próprios feitos. Outras, subíamos o morro do Cruzeiro, uma baita subida que muitas vezes desistíamos no meio e andávamos por toda a cidade de bicicleta. Numa dessas vezes, descemos a rua a toda velocidade e na hora da curva eu caí e ralei a perna - guardo a cicatriz com carinho até hoje. Na hora, saiu muito sangue e minha prima foi até sua casa trazer algo para eu me limpar. Trouxe uma toalha que ficou com tanto sangue que achamos melhor jogar no lixo para nossas mães não verem e levarmos bronca. Claro que levamos mesmo assim...

Para irmos à roça em grupo tínhamos que ter atenção, pois tinham os "andantes" no caminho, diziam. Uma vez sã e salvos na roça, explorávamos todos os cantos, desde a cascata testando vários jeitos de descer por suas águas, principalmente depois que chovia e a vazão de água aumentava - até a subida à serra, por onde víamos toda a extensão de terras da região além de ter dois lagos à nossa disposição. Em geral, usávamos o que meu avô não estava pescando, já que ele detestava barulho. Uma vez até jogou uma bota em mim, porque deixei escapar uma risada, claro, que não adiantou nada e só dei mais risada, e logo precisei sair correndo com medo de sua reação. Também era comum andarmos pelas fazendas vizinhas, quando parávamos na água santa, uma pequena queda d'água, um ponto de referência, e assim fomos aprendendo o valor dos símbolos passados de geração a geração e dos milagres da natureza que temos que nos conectar e preservar.

Uma vez andando a cavalo, prendi meu pé na barriga do cavalo, um erro, e logo ele começou a saltar incomodado. Caí no chão levando meu irmão Gabriel junto e sempre carreguei essa culpa por tê-lo feito cair também. A culpa só não foi maior porque nessa queda fui eu quem me machuquei mais ganhando um braço quebrado. No parquinho arriscávamos voos altos nos balanços e giros rápidos no gira-gira. A gente comia tudo que era fruta do pé, verde ou madura, carambola era minha preferida. Acho que mais pela raridade de encontrá-la do que pelo sabor.  Quando chovia brincávamos de escritório e escolinha, porque para a gente não tinha tempo ruim, a gente brincava sempre. Brincávamos com todos os bichos: cachorros, vacas, uma vez uma até se apaixonou por mim me seguindo por tudo que é canto, até entrou na casa, meu tio acabou até me dando-a de presente. Não lembro seu nome, mas lembro de outras, a Canela e a égua Tieta. Cada ano escolhemos o nome das vacas na ordem alfabética para sabermos de que ano é cada uma. Recentemente, por exemplo, precisava escolher com a letra R e a nomeei uma bezerra de "Revolução do povo". Lembro uma vez que mataram um porco, cena horrível, o animal não parava de gritar nunca, fiquei um tempão sem comer carne. Já Gabriel se divertiu, tem uma foto dele em cima do porco cortado ao meio.

Fotografias ajudam nesse resgate... Tem um monte de coisa que eu tenho precisamente gravado na memória porque vi a imagem por muitas vezes posteriormente. Muitas dessas imagens revelam essa infância carregada de liberdade, respeito, potência e alegria. Documentações importantes que me ajudam a reconstruir minha história e comunicam os valores e escolhas desse tempo.


Na verdade este texto nasceu após saber, ontem, do falecimento de um grande mestre para mim, Rubem Alves. Suas sábias palavras, principalmente nos livros "Quando eu era menino" e "A alegria de ensinar" me ajudaram a redescobrir minha meninice em meio à natureza e pessoas queridas para me encontrar comigo mesma, nos vários tempos que se seguiram, para fazer minhas escolhas, como ser pedagoga, lutar por uma infância respeitosa e livre a todos, ser mãe e criar meus filhos de maneira coerente com minha história.

É com imensurável alegria que vejo meus filhos brincarem  na roça, mantendo ativo um ciclo de vida de minha família e de nossa humanidade, dando sentido às nossas pequenas histórias que tanto nos engrandecem e nos fazem aproveitar a vida em sua essência, e com muita tristeza me despeço desse grande homem, que nesse plano, encerra seu ciclo, mas só em parte, uma vez que sua obra é tão viva e certamente continuará perdurando e ecoando por muitas gerações de pessoas comprometidas com a vida no seu sentido maior. Que você siga em paz, meu querido, com a sua alegria de sempre. Amo.


Seguem imagens de nossa última viagem à roça em conexão a alguns pensamentos de Rubem Alves...



"As crianças não têm ideias religiosas, mas têm experiências místicas. Experiências místicas não é ver seres de outro mundo. É ver este mundo iluminado pela beleza."
"Quem experimenta a beleza está em comunhão com o sagrado."





"Não tenho problemas com Deus. Mas tenho muitos problemas com aquilo que os homens pensam sobre Deus."
"Deus é alegria. Uma criança é alegria. Deus e uma criança têm isso em comum: ambos sabem que o universo é uma caixa de brinquedos. Deus vê o mundo com os olhos de uma criança. Está sempre à procura de companheiros para brincar."



"Aprenda a gostar, mas gostar mesmo, das coisas que deve fazer e das pessoas que o cercam. Em pouco tempo descobrirá que a vida é muito boa e que você é uma pessoa querida por todos."



"Somos as coisas que moram dentro de nós. Por isso, há pessoas tão bonitas, não pela cara, mas pela exuberância de seu mundo interior."



"Não havíamos marcado hora, não havíamos marcado lugar. E, na infinita possibilidade de lugares, na infinita possibilidade de tempos, nossos tempos e nossos lugares coincidiram. E deu-se o encontro."





"Aquilo que o coração ama fica eterno."






"Amar é ter um pássaro pousado no dedo.
Quem tem um pássaro pousado no dedo sabe que,
a qualquer momento, ele pode voar".



"Não haverá borboletas se a vida não passar por longas e silenciosas metamorfoses."


  

"Quem sabe que o tempo está fugindo, descobre, subitamente, a beleza única do momento que nunca mais será..."



"A vida não pode ser economizada para amanhã. Acontece sempre no presente."

  

 "O tempo pode ser medido com a batidas de um relógio ou pode ser medido com as batidas do coração."



"Mas é preciso escolher. Porque o tempo foge. Não há tempo para tudo. Não poderei escutar todas as músicas que desejo, não poderei ler todos os livros que desejo, não poderei abraçar todas as pessoas que desejo. É necessário aprender a arte de “abrir mão” – a fim de nos dedicarmos àquilo que é essencial."



"Lutam melhor aqueles que têm sonhos belos. Somente aqueles que contemplam a beleza são capazes de endurecer sem nunca perder a ternura. Guerreiros ternos. Guerreiros que leem poesias. Guerreiros que brincam como criança."


 

"Todo conhecimento começa com o sonho.
O sonho nada mais é que a aventura pelo mar desconhecido, em busca da terra sonhada. Mas sonhar é coisa que não se ensina, brota das profundezas do corpo, como a alegria brota das profundezas da terra. Como mestre só posso então lhe dizer uma coisa. Contem-me os seus sonhos para que sonhemos juntos."




"Pois ser mestre é isso: ensinar a felicidade."
"Para isso existem as escolas: não para ensinar as respostas, mas para ensinar as perguntas. As respostas nos permitem andar sobre a terra firme. Mas somente as perguntas nos permitem entrar pelo mar desconhecido."




"Suspeito que nossas escolas ensinem com muita precisão a ciência de comprar as passagens e arrumar as malas. Mas tenho sérias dúvidas de que elas ensinem os alunos a arte de ver enquanto viajam."




"E bem pode ser que as pessoas descubram no fascínio do conhecimento uma boa razão para viver, se elas forem sábias o bastante para isto, e puderem suportar a convivência com o erro, o não saber e, sobretudo, se não morrer nelas o permanente encanto com o mistério do universo."




"Há escolas que são gaiolas e há escolas que são asas."
"Quem tenta ajudar uma borboleta sair do casulo a mata.
Quem tenta ajudar um broto sair da semente o destrói.
Há certas coisas que não podem ser ajudadas. Tem que acontecer de dentro para fora."
"Os educadores, antes de serem especialistas em ferramentas do saber, deveriam serem especialistas em amor: Intérpretes de sonhos."





"Enquanto a sociedade feliz não chega, que haja pelo menos fragmentos de futuro em que a alegria é servida como sacramento, para que as crianças aprendam que o mundo pode ser diferente. Que a escola, ela mesma, seja um fragmento do futuro..."

"Ao final de nossas longas andanças, chegamos finalmente ao lugar. E o vemos então pela primeira vez. Para isso caminhamos a vida inteira: para chegar ao lugar de onde partimos. E, quando chegamos, é surpresa. É como se nunca o tivéssemos visto. Agora, ao final de nossas andanças, nossos olhos são outros, olhos de velhice, de saudade."



 "A saudade é a nossa alma dizendo para onde ela quer voltar".



  



Fica a dica para quem ama e sentirá saudades de Rubem Alves. O documentário "Eu, maior": http://www.eumaior.com.br/  . Além de seus tantos livros inspiradores...


segunda-feira, 14 de julho de 2014

Totalmente à deriva!!!

Com o tempo fui aprendendo a exercer a tolerância diante de  posicionamentos distintos dos meus, ainda que, cá entre nós, esse seja ainda uma meta constante. No decorrer, ficou claro que para mim, irritante mesmo é quem tem um discurso politicamente correto e na prática não o exerce. A maioria das pessoas de meu convívio, ao contrário, levam uma vida de bem, praticam a solidariedade, e são grandes modelos para mim. No entanto, muitas delas, diante de situações conflitivas, em geral, incentivadas pela grande mídia sem escrúpulos, assumem uma postura conservadora, temerosa, elitista e preconceituosa com o povão, às vezes até mesmo tendo sua origem daí. Em geral, tenho conseguido tolerar certos comentários, levando em consideração meus laços afetivos, a compreensão de que as visões de cada um são mesmo distintas e que as experiências que tive em minha trajetória são mesmo privilegiadas para fazer certas ponderações e principalmente que vivemos. Ainda assim, nesses momentos me sinto totalmente à deriva ao ouvir suas opiniões retrógadas como também ao ouvir o pessoal do outro lado extremo responder com comentários arrogantes, cegos e também preconceituosos. Vergonha alheia, não compartilho com isso. No entanto, em alguns momentos me embrulha o estômago ver tanto ódio, ouvir tantas análises errôneas, simplistas e preconceituosas, e então me manifesto.Este texto nasceu de meu exercício constante em relacionar-me com meus semelhantes. Experiência que me engrandece e por isso não a realizo apenas no plano individual como no profissional também, sempre com a seguinte questão em mente: lidar, aprender e crescer com gente para virar cada vez mais gente.


“(...) nascemos para a humanidade. Nossa humanidade biológica necessita uma confirmação posterior, algo como um segundo nascimento no qual, por meio do nosso próprio esforço e da relação com outros humanos, se confirme definitivamente o primeiro. É preciso nascer para humano, mas só chegamos a sê-lo plenamente quando outros nos contagiam com sua humanidade deliberadamente e com nossa cumplicidade."

Fernando Savater – O valor de Educar


Relacionar-se, contudo, nem sempre é fácil, por vezes fico triste, brava ou indignada. Mas ainda bem, logo em seguida acontece alguma coisa ao meu redor que novamente anima minha alma, e me faz ver as coisas belas do mundo, ainda mais que sou educadora e mãe apaixonada, e as crianças, em sua cultura, trazem a essência da vida, e nos trazem a esperança de novos tempos. Tem gente que chama esse meu movimento de alienação, outros de otimismo, e outros ainda de vocação para ser feliz - eu acho mesmo que é uma escolha. Uma forma de ver o mundo.
 
 
  de Armandinho.

  

Depois do jogo Brasil e Alemanha, em que perdemos de 7 a 1, deixando de participar da final da Copa do Mundo, uma tia, queridíssima, mandou no facebook a seguinte mensagem: "O PT se F....". Quando me manifestei dizendo que aquele comentário não tinha lógica e não era construtivo naquele momento outras pessoas, também queridíssimas, também colocaram seu ódio a esse partido dizendo que quem acredita nele fica à deriva. Fiquei com essa última expressão na cabeça, quando me dei conta de que apesar de não ser esta a razão por ter me manifestado (estar a favor do PT), sou mesmo uma pessoa que vive totalmente à deriva!!!!

Significado de Deriva (http://www.dicio.com.br/deriva/)

s.f. Desvio de navio (ou de avião) na sua rota, por efeito do vento ou de uma corrente.
À deriva, sem rumo certo, ao sabor de.
 

Desde a infância fui uma menina que viveu de um jeito singular todas as situações. Muito observadora, tive liberdade para expressar minha subjetividade e cresci "ao efeito do vento". Como minha mãe dizia: "Não sei como a Juliana consegue ir bem na escola, ela é tão desligada...". Assim, vivi cada situação, ora de um jeito profundo, ora à parte, o que pode servir para nos darmos conta de que não existe um só jeito de vivenciar e sentir as coisas. No meu caso, estar à deriva não me impediu de viver plenamente cada descoberta da infância e depois da adolescência. Pelo contrário, era como se de maneira intuitiva, eu escolhesse diferentes maneiras de me envolver, de mergulhar, de estar inteira em cada vivência. A cada nova situação eu interagia, respondia e experimentava sem a menor responsabilidade do que aquilo viraria, como acredito que deve ser vivido essas primeiras fases quando, mais do que nunca, cada ser tem o direito a experimentar-se plenamente em todas suas possibilidades, sempre com muito respeito e liberdade e com "sabor de vento"!!! Um deleite à alma.
 
Em minha juventude, potencializada por uma vivência no curso de Pedagogia numa universidade pública politizada, e naturalmente pela própria idade que traz em sua essência a necessidade de transgredir com o velho, de gritar aos quatro ventos que o novo chegou, fui mais incisiva e teimosa ao falar sobre minhas escolhas. Nesse momento, escolhi uma corrente, a que achava mais justa com os princípios democráticos  e mergulhei nessa experiência: publicações de manifestos, passeatas, vivência em C.A.s em todo o país, em Cuba, em reflexões sobre educação e os direitos das crianças e do adolescente, atuação em sala de aula com educação de jovens e adultos e em espaços educativos formais e não formais com crianças. Naquele momento, minhas ideias se aproximavam das do PT, mas mesmo assim, não quis me filiar a ele ou votar em algum candidato apenas por ser desse partido. Era como se eu tivesse escolhido acompanhar o navio do PT, mas ao tempo de meu vento e à corrente de meus pensamentos, ficando assim "à deriva, sem rumo certo", e principalmente, livre para poder criar meu próprio caminho e transgredir, inclusive, nesse ambiente.
 
Essa maneira de me relacionar é mesmo uma característica minha. Em vários outros aspectos também fico à deriva. Por exemplo, sou uma pessoa de muita fé. Fé em Deus, na energia das coisas, nas pessoas, na vida. Ainda assim nunca consegui me vincular a alguma religião, e quer saber? Sigo feliz, o que sinto na verdade, é que algumas pessoas não ficam feliz com a minha escolha. Não conseguem assim me encaixar facilmente nos padrões conhecidos e então me rotulam erroneamente. Na época da faculdade, se estava com meus amigos de infância ou de bairro era vista como a petista, a revolucionária questionadora e que metade das coisas que falava era incompreensível ou mesmo descartável uma vez que ao me rotularem não buscavam uma ampliação em seus modos de pensar. Quando estava com o povo do movimento estudantil, com minha minissaia típica da época, era vista como uma professorinha, burguesinha alienada, metida a desencanada. Assim, por muitas vezes estive à deriva, não me encaixando em nenhum lugar. Às vezes sofrendo, já que buscamos o sentimento de pertencimento a algum grupo, por vezes me sentindo satisfeita em me diferenciar, outra busca de todos nós. De todo modo, fui descobrindo que o mundo é maior, bem maior, e desde então sigo lutando pelo direito que todos temos a viver o melhor da vida, livres, nivelando as coisas por cima e não por baixo, para podermos sentir as coisas ao nosso modo e não aos dos outros.

Nesse processo, também descobri que os preconceitos rondam todos os agrupamentos humanos até mesmo naqueles que se dizem libertários, e que também tinha os meus. Afinal, nos perderíamos de nós mesmos e ficaríamos à nossa própria deriva, sem identidade se aceitássemos com facilidade tudo que nos aparece de novo, a resistência pode ser positiva nesse sentido como algo que nos protege enquanto conseguimos nos estruturar para recebermos o novo como algo que nos complementa. Por vezes me meti em discussões necessárias e outras desnecessárias, mas claro que apenas hoje posso dimensionar em qual cada uma se encaixava... Na época, todas me foram essenciais, constituintes de minha história. Aprendi inúmeras coisas nesses debates. Desde argumentar a experimentar verdadeiros encontros, mesmo soando desencontros pelos pontos de vistas diversos, mas verdadeiros, pois segundo Luiza Christov, não foram encontros com o igual, comigo mesma, mas com o diferente, possibilitando uma alteração em minha relação com o outro e alargando meu ponto de vista, que como diz Peter Pál Pelbart, nada mais é do que a vista de um ponto. O encontro com o diferente é desafiante, o que exige um esforço de todos nós se quisemos crescer juntos, numa rede sólida e solidária. Sei que ganho muito com essa troca, por isso meu empenho, e imagino o empenho das pessoas ao meu redor para também considerarem minhas opiniões como produtivas, agradeço de coração.

Lembro-me do dia em que Lula ganhou as eleições, que alegria, que festa! "A esperança venceu o medo!" era o que cantávamos. Finalmente nossa sociedade estava dando a chance de um partido diferenciado fazer algo pelo país, uma vez que as coisas não estavam boas para toda a população (é bom a gente sempre se lembrar disso).  Além do mais, nesse dia de vitória, em meio à avenida Paulista, dei meu primeiro beijo no Luiz e desde então seguimos juntos...rs. Desde então muita coisa aconteceu no país e já experimentei muitos tipos de sentimentos. Hoje, não me arrependo da escolha feita, ela tinha muito sentido naquele momento histórico, e certamente algumas ações foram importante para conquistarmos uma maior equidade social e uma estabilidade econômica, porque por mais que tenha minhas ressalvas quanto ao sistema de bolsas, por exemplo, algo precisava ser feito nessa direção para que uma boa parte da população não seguisse mais à deriva de uma vida digna que lhes é de direito.

Agora, continuo à deriva, uma vez que a oposição, de maneira geral, é muito conservadora, chegam a dizer, por exemplo, que o PT trouxe o comunismo ao Brasil - faça-me rir, vamos estudar um pouco mais os modelos econômicos e entender que estamos mergulhados no capitalismo. Certa vez, Lula pediu, quase implorou para que os brasileiros não parassem de consumir! Até para entendermos alguns pontos de discórdia entre os próprios integrantes desse partido. Tem gente que continua até hoje lá em nome de reconstruí-lo e de fazer jus à sua história como gente que anda pagando injustamente por uma estruturada toda falida. Também tem gente que inventa  e acredita em cada coisa só para manchar a imagem deste partido, a última foi sobre a seleção alemã que fez casas para o povo na Bahia, faça-me gargalhar. Tem também gente que xinga a presidenta atual, autorizando as crianças, por exemplo, a desrespeitarem outras autoridades como, por exemplo, suas professoras, faça-me chorar. A outra parte da oposição, dizendo também de maneira bem geral, infelizmente, é pouco consistente, mostrando alternativas semelhantes, pouco corajosas, transformadoras. Recentemente, contudo, tenho visto cada vez com maior expressão, graças à internet, a algumas manifestações libertárias, de quem analisa criticamente, se coloca e pensa em soluções de maneira positiva e não pessimista, de quem quer mesmo ver mudanças significativas.

Com o tempo fui aprendendo a exercer a tolerância diante de  posicionamentos distintos dos meus, ainda que, cá entre nós, esse seja ainda uma meta constante. No decorrer, ficou claro que para mim, irritante mesmo é quem tem um discurso politicamente correto e na prática não o exerce. A maioria das pessoas de meu convívio, ao contrário, levam uma vida de bem, praticam a solidariedade, e são grandes modelos para mim. No entanto, muitas delas, diante de situações conflitivas, em geral, incentivadas pela grande mídia sem escrúpulos, assumem uma postura conservadora, temerosa, elitista e preconceituosa com o povão, às vezes até mesmo tendo sua origem daí. Em geral, tenho conseguido tolerar certos comentários, levando em consideração meus laços afetivos, a compreensão de que as visões de cada um são mesmo distintas e que as experiências que tive em minha trajetória são mesmo privilegiadas para fazer certas ponderações e principalmente que vivemos. Ainda assim, nesses momentos me sinto totalmente à deriva ao ouvir suas opiniões retrógadas como também ao ouvir o pessoal do outro lado extremo responder com comentários arrogantes, cegos e também preconceituosos. Vergonha alheia, não compartilho com isso. No entanto, em alguns momentos me embrulha o estômago ver tanto ódio, ouvir tantas análises errôneas, simplistas e preconceituosas, e então me manifesto.

Nesse cenário, mais uma vez também fico à parte de alguns agrupamentos sociais de minha rede de conhecidos, já que a maior parte das pessoas ainda não percebeu que o mundo é maior, tem bem mais do que dois lados, e acham que ou você é PT ou está contra ele. Que visão mais pequena das coisas, do mundo, se si mesmos, de seus pares!!! Nesse cenário, o mais irônico é que até concordo com alguns apontamentos feitos pela oposição, mas não pela origem deles ou não com suas soluções. Eles falam, por exemplo, que querem mais escolas... Opa, eu também quero. Mas não quero qualquer escola, muito mais do que quantidade quero qualidade e isso ninguém discute, nem os políticos nem as pessoas que se iludem com números ou siglas.

Qual é a escola de nossos sonhos? Pergunta essencial. Será uma em que as professoras são tratadas como tias, recebem mal, não têm formação continuada, com uma coordenação à mercê da clientela dos pais ou ignorando-os, num espaço precário, pouco estimulante e nada estético, em que as crianças não são ouvidas, respeitadas em seu tempo e possibilidades, respeitando-se a cultura da infância, que não brincam em demasia e só assistem DVD, que não são estimuladas a conviverem de maneira harmoniosas nas diferenças e que desde a educação infantil recebem aula de educação financeira com expectativas de vestibular???? Essa, definitivamente não é a escola dos meus sonhos ao qual batalho todos os dias para fazer acontecer. Muito menos é um retrato  da escola pública, muitas são bastante comprometidas, ao contrário de algumas particulares. Mas certamente é a escola dos sonhos de alguns que reclamam que querem mais escolas enquanto outros que reclamam nem sequer pensaram nisso como se fosse coisa secundária num planejamento de governo. Contudo, é essencial pensarmos nas concepções por trás das escolhas. Será que todo mundo sabe o plano de governo de seu candidato? O que realmente ele vai fazer de diferente caso ganhe além de prometer vagamente "mais e mais" escola, hospital etc. Uma pena isso não ser prioridade... As coisas desse jeito dificilmente vão mudar independentemente do partido que estiver à frente do governo federal, ou estadual, municipal (tem sido comum nos esquecermos de que estes podem ser agentes ativos ou não nesse processo). 

Sobre a Copa, por exemplo, fui da turma que achava que não era nossa prioridade realizá-la frente a tantos problemas que enfrentamos diariamente, mas uma vez que foi decidido (há bastante tempo atrás), sou da opinião de que ela tinha que ser realizada do melhor jeito possível, inclusive, para aproveitarmos depois o legado da mesma. Aí vem o pessoal pessimista que diz que os estádios vão ficar abandonados, ora, então não deixemos, por que vamos escolher lutar contra não tê-la do que preservá-la? É uma escolha. E para cada ponto que o pessoal do contra coloca, costumo ponderar, em certa medida até concordar, mas acima de tudo, buscar soluções para que a gente reverta as coisas. Não trata-se de mascarar o que foi feito, até mesmo suas falhas, mas de analisá-las por completo, colocando-as num cenário maior. Nada do que aconteceu na Copa é distinto do que acontece cotidianamente seja no Congresso ou no Largo da Batata.

Com o foco grande na Copa, algumas coisas ficaram mais visíveis nas manchetes ou continuaram obscuras quando interessou à grande mídia ou aos donos do poder que não são apenas do PT. Muitas vezes fiquei indignada com alguns acontecimentos, mas acima de tudo vi nesse evento a oportunidade de fazermos diferente, de sermos tocados por um espírito coletivo comum, e batalharmos por questões que nos são pertinentes. Afinal não trata-se de se ter hospital ou Copa. Nós precisamos de tudo. "A gente não quer só comida, a gente quer comida, diversão e arte", como cantou Arnaldo Antunes e Marisa Monte. Eu quero tudo, do bom e do melhor, porque temos esse direito.

Vejamos a campeã da Copa, a Alemanha, mesmo com sua história de exclusão e superação e seus problemas, ela tem planejamento que possibilita todas essas concretizações. Enfim, somos povos distintos, ainda bem, mas podemos também ter tudo. Basta que pensemos juntos como queremos vivenciar a próxima Copa do Mundo, por exemplo, e todos os outros assuntos também. Felipão saiu da seleção como técnico, isso basta??? Claro que não, vamos parar de achar culpados de maneiras simplistas para deixarmos de ver que o desafio é grande, temos muitos buracos em nossa história, mas somos capazes de superá-los desde que tenhamos disposição e coragem para construirmos bases sólidas. Não trata-se de termos as mesmas opiniões, mas de somarmos esforços para na nossa diversidade construímos projetos comuns na construção de uma sociedade mais justa e potente. Os momentos difíceis e caóticos, inclusive, podem ser ótimos momentos para exigirem de nós uma parada coletiva e a busca pelas melhores soluções possíveis. Nessa corrente seu sigo seja no futebol, aqui em casa, no trabalho, na vida, nos sonhos. É uma postura, é uma escolha de viver.

Aproveitei bastante a Copa para torcer pela seleção de meu país junto de meus amigos, familiares e dessa vez, de meus filhos. Foi emocionante completar o álbum de figurinhas com Mateus, vê-lo encantado com o hino, pedindo-me para cantar várias vezes, como pendurar nossa bandeira no carro, colocar o uniforme e vibrar com cada gol - até mesmo com aquele nosso único gol contra a Alemanha, o que de certa forma me ajudou naquele momento, pois a partir de seu gesto vi que consegui o mais importante com ele e com minhas meninas que agora veem uma bola e já saem gritando: "Gol do Brasil!!!": contagiá-los com a alegria de um esporte, no caso o futebol, mas podendo ser qualquer outro, e principalmente, com a experiência de uma vivência coletiva para celebrarmos algo em comum, nunca vou esquecer a carinha de meus filhos no primeiro gol do Brasil na Copa vendo todos nós enlouquecidos ou mesmo do espanto do Mateus ao sair pela rua, e ao ver todo mundo uniformizado, comentar: "Todo mundo é Brasil?", uma vez que ele está acostumado a sair com a do Corinthians e ver que agrada alguns e outros não, mas naquele dia ele pôde ver todos na mesma sintonia, um aprendizado bem importante, e com alegria ele passou a cumprimentar todos com um simpático: "oi brasileiro!". Ontem mesmo quando foi ao supermercado e ainda tinha bandeirinhas penduradas lá estava ele pulando e gritando: "Vai Brasil!". Meu menino, totalmente à deriva e totalmente livre e feliz. Maior orgulho da mamãe aqui, que continue assim...

A maternidade me trouxe um amor ainda maior à humanidade, ela me reconectou aos meus ancestrais e me encheu de responsabilidade para com a nova geração e para com o mundo, o lugar onde moramos. Assim, vou continuar cultivando em meus filhotes o amor ao país, seja na vitória ou na derrota... E se este for o caso, vamos pensar em soluções a favor dele e não contra nós.

No decorrer da Copa fui me animando, como se saboreando o gosto daquela corrente positiva, cheia de emoção, principalmente ao ver as nações latino-americanas também se destacarem na competição. Nossa casa se encheu de diferentes torcidas e também foi importante para Mateus ver que podemos torcer por outros, nos identificarmos com outros povos. Além disso, também vivi uma situação bem especial ao torcer pelo Brasil em terras argentinas e na comemoração da vitória perceber que o povo derrotado, a Colômbia estava fazendo uma festa muito mais animada do que o gueto brasileiro e de um jeito muito hospitaleiro eles nos receberam em sua casa, onde dançamos salsa animadamente, apenas reforçando meu sentimento de irmandade com os povos de terras latino americanas. Fomos todos explorados, nossos povos nativos massacrados, os exploradores vitoriosos, nosso desenvolvimento precário aos interesses da pequena população detentora de poder, povo formado pela mestiçagem, mas muito guerreira que cada uma ao seu modo foi resistindo e se reconstruindo. Mas sabe que outros povos também me encantam e nessa Copa me conquistaram de vez, ver por exemplo, os alemães comemorarem o título com uma dança indígena que aprenderam uma tribo pataxó que tiveram contato na Bahia, foi lindo de morrer... Nunca vi nossos brasileiros fazerem coisa semelhante... E se algum já fez, me pergunto por quê não demos tanta visibilidade a tal feito. Agora é capaz de vermos mais, pois temos a mania irritante de só valorizarmos nossa cultura quando um estrangeiro o faz.

Realmente esse espírito coletivo tem um poder tremendo, ele tanto pode despertar o melhor de nós, ou o pior... No dia de nossa derrota à Alemanha voltei duramente à realidade como se tivesse passado por um vendaval ou maremoto:  nossa seleção sem chance de vencer a Copa e novamente os dois lados emergindo das trevas no facebook!!! Nesse momento de dor (sim, eu sei que é apenas futebol e que é a coisa mais importante das coisas menos importantes, mas ainda assim dor), ouvir comentários  de pessoas que até então estavam se divertindo com o clima de festa, cheios de ódio, não só ao partido, mas a todos nós que estávamos desolados, me causou indignação.

Diferentemente das boas mães que avisam dos perigos da vida e quando seus filhos cometem os erros previstos, elas soltam o famoso: "eu avisei",  que podem até estar impregnados de raiva, mas acima de tudo de amor por quem está sofrendo e por isso mesmo sofre junto num misto de proteção e culpa por não ter conseguido evitar o erro do filho. Mas naquele momento, comentários como "o PT se f..." em nada de parecem com o de minha mãe amorosa. São carregados de ódio de quem torce para as coisas darem errado para poder cutucar o ferido, espezinhar em cima, mesmo que fosse em quem não estivesse em campo, mas em quem estivesse assistindo pasmado ao desfecho do jogo como era meu caso, como  não percebendo que muitas vezes esse sentimento demonstra que quem ataca também está ferido. Não é preciso ser psicóloga para saber que algo a mais há por trás de todo esse sentimento. Cabe a cada um ter coragem de se perguntar o que de fato me incomoda no outro, se ao se olhar pelo reflexo do outro vemos nossa própria dificuldade, nossas limitações, nossos medos e o que temos feito de construtivo na transformação da realidade que tanto nos incomoda.

Assumo assim minha própria corrente, ainda que à deriva desses dois lados, porque para mim o mundo físico e abstrato tem muito mais do que dois lados. E "simbora" passar adiante esse conceito porque senão voltamos para os tempos das trevas antes de Copérnico. Socorro!!! E de tanta, mas tanta coisa que poderia ter dado errado (importante reconhecê-las e analisá-las com cuidado também), o mais importante de dizer, porque não é o que a grande mídia está focada, é que MUITA coisa deu certo. Fizemos uma Copa do C....!!!! E eu, com muita alegria, aproveitei demais! Que passe rápido os próximos 2 anos para eu torcer de novo pelo meu país nas Olímpiadas!!! E até lá, sigo à deriva...



Fernando Anitelli  -  Síntaxe aberta - O Teatro Mágico
http://www.vagalume.com.br/o-teatro-magico/sintaxe-a-vontade.html

Ah! E pra dar risada, sugiro o link abaixo com as 100 coisas mais incríveis dessa Copa:
http://www.buzzfeed.com/manuelabarem/100-coisas-incriveis-que-aconteceram-na-copa-do-mundo-2014