sábado, 29 de dezembro de 2012

Sem direitos

A maternidade transformou minha vida, e graças a ela tenho vivenciado experiências maravilhosas, únicas e profundas com meus 3 filhos lindos e cheios de saúde. Amo, amo demais meus pequenos, agradeço todos os dias suas existências e faço tudo para que continuem crescendo bem. No entanto, apesar de toda essa riqueza preciso confessar que em alguns momentos fico angustiada quando percebo que ser mãe também significa perder alguns direitos.

Sei que uma das maiores dádivas de ser mãe é exatamente a de nos entregarmos incondicionalmente a um outro ser, pois como disse Elisa Lucinda:



"A grande lição que o poder de gerar nos dá é a da generosidade. Ainda que não tenha saído de nosso ventre. A arte de ser mãe e pai é essencialmente a arte de cuidar".

Por isso tudo, cuido dos meus filhotes com todo meu amor. Mas cada vez mais tenho chegado à conclusão de que para cuidar bem deles também preciso cuidar de mim - e é por esse motivo, o desabafo de hoje.

Estou há duas semanas com uma crise de rinite alérgica e com muita dor de cabeça (algo que nunca tenho e que vem me enlouquecendo) e para completar hoje acordei muito cedo por causa dos pimpolhos. Fato que desde há três meses, desde o nascimento das meninas vêm acontecendo e apesar do cansaço venho lidando tranquilamente com isso. Mas justamente hoje, quando elas finalmente dormiram das 20h até às 6h, algo inédito e digno de ser comemorado, Mateus, que sempre dorme a noite toda parece que adivinhou e inventou de ter insônia e ficou rolando na nossa cama desde às 4h e mais: dando pontapés nos meus seios inchados e doloridos, já que as meninas ainda não tinham mamado e arrancando meus cabelos (ele tem a mania de dormir fazendo carinho nele, uma delícia!Só que quando não consegue dormir ele enrola as mãos e puxa meu cabelo com força, um inferno!). Por tudo isso, estou mal humorada e vou escrever agora que com a maternidade ganhamos um monte de coisas, mas também perdemos outras e aqui vou tratar da perda de direitos sobre nosso próprio corpo.

Desde a gestação nosso corpo muda (e olha que nem sou paranóica com isso). Acho um absurdo mulheres que não querem engordar na gravidez e costumo aconselhá-las a não engravidar caso não queriam mudar o tamanho da calça e do sutiã. Mas de qualquer maneira é algo que mexe com a gente, principalmente no início quando engordamos sem a barriga aparecer e no final quando a barriga é mais visível do que qualquer outra coisa. Na minha última gestação então que as duas meninas cresciam assombrosamente dentro de mim a barriga era algo muito, muito notável, assunto de toda roda de conversa ainda que eu quisesse silenciar. E vamos combinar que tem muita gente sem noção que faz uma cara de espanto de filme de terror quando te vê - quando não faz algum comentário desagradável. Para essas pessoas, homens e mulheres (algumas já mães, pasmem!) só posso dizer: sensibilidade zero.

Ainda durante a gravidez dá para fazer uma lista de dez páginas de mudanças corporais que ocorrem. De maneira geral, tive gengivite, dores nas costas, sono e cansaço. Meus três partos foram naturais (uma até sem anestesia), o que foi ótimo, mas claro que também traz o desconforto do corte na vagina. O sangramento posterior é bem chato e a volta a namorar bem delicado (mas essencial).

Mas mesmo depois do nascimento de nossos filhos nosso corpo continua sendo público: ao amamentarmos (e sim temos de fazê-lo, primeiro porque é uma delícia de carinho e segundo porque alimenta bem nossa prole) nosso peito é dos seres que nos sugam. Às vezes racham, empedrejam e secam, e por conta disso sofremos horrores, mas o fato é que tem alguém que é possuidor de nossos seres, não importa onde estejamos (pois sim, temos que poder dar de mamar em qualquer lugar), lá estão as boquinhas abertas que só sossegam ao nosso acalento e ao nosso leite. E haja leite! Temos que ficar o tempo todo com absorventes nos seios, porque senão molhamos tudo. Uma vez tive que comprar um vestido (sendo que não é qualquer roupa que podemos usar: precisa ter abertura na frente) simplesmente porque tinha me esquecido de sair com eles. Mesmo quando crescidos nossos fofuchos ainda precisam de nossos colos (haja força! Quando Mateus nasceu tive até tendinite no pulso) quando não de outras partes de nosso corpo como, por exemplo, o Mateus com meus cabelos. E por falar em cabelos, eu, que sempre tive queda deles, durante o período de amamentação a queda aumenta demasiadamente. Sem exagero meus fios estão em qualquer lugar, é irritante e desesperador!

Além disso, só conseguimos suprir nossas necessidades quando as deles estão satisfeitas. Assim, só comemos quando eles já estão comidos, só bebemos quando estão mamados, vamos ao banheiro quando estão dormindo e quando são maiores com eles ao nosso lado papeando sobre nossos "feitos", dormimos quando eles dormem (no meu caso, só à noite, já que dificilmente consigo dormir durante o dia, e mesmo que quisesse as meninas andam cada vez mais sapecas alternando os horários de sono - acho que só para cada uma ter um momento sozinha comigo), na verdade, quando eles dormem conseguimos fazer nossas coisas, Luiz agora mesmo acabou de me dizer: "deixa eu tomar banho antes que Mateus acorde!" (sim, depois de aprontar desde às 4h da manhã ele dormiu gostoso e nós dois estamos aqui acordados... aff!), saímos com nossos maridos quando estão com alguém seguro (agora com 3 filhos essa situação ficará ainda mais rara de acontecer, pois precisaremos de "alguéns" seguros ao mesmo tempo), namoramos quando nossos filhos e o cansaço permitem, saímos sozinhas apenas quando necessário (médico, banco, por exemplo, ou até mesmo porque estamos a ponto de explodir e alguém sensível percebe e diz: "vai dar uma volta que eu fico com a criançada"), raramente vamos ao cabeleireiro, manicure, depiladora, na ginástica, enfim, como disse os cuidados com a gente mesmo está sempre condicionado aos nossos filhos estarem bem cuidados (respeito essa ordem, não quero invertê-la, apenas reitero que estou num dia de desabafo).

Juntando todo o cansaço que a correria de cuidar de um bebê gera também existem as mudanças no nosso corpo e mente que os hormônios fazem conosco desde a gestação. É uma loucura!!! Hoje entendo algumas mães que piram, a verdade é que vivemos mesmo no limbo entre a loucura e a sanidade, muito fácil pular de um a outro. Ficamos muito sensíveis, vulneráveis, mas também muito fortes e cheias de fé, muito medrosas, mas também muito corajosas, muito esgotadas, mas muito renovadas, muito malucas, mas muito plenas, muito inseguras, mas muito confiantes, muito acabadas, mas muito belas, muito reclamonas, mas muito, muito realizadas. Enfim, tudo junto, tudo misturado. Isso sem mencionar que nosso corpo não tem mais o direito de ir e vir, e depende de um outro.

E claro, tem aquele direito que perdemos no exato momento que ganhamos nossos bebês, e com certeza o mais difícil de lidar de todos, um medo e desafio constante no dia a dia de qualquer mãe: que é o de morrer. Sabemos que na maioria das vezes isso não está diretamente em nossas mãos, mas ainda assim só de pensarmos na possibilidade de deixarmos nossos pequenos já sentimos culpa pelo abandono e desespero total pela ausência. Por tudo isso é que escolho ser uma mãe muito, muito presente ainda que uma mãe que precise desabafar de vez em quando do cansaço de todo dia, mas de qualquer maneira uma mãe presente - e APAIXONADA!!!!


Citação retirada do livro: "Parem de falar mal da rotina" de Elisa Lucinda. Página 89. Lua de papel. Recomendo!!!

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